segunda-feira, 18 de junho de 2012

Fome e sede na era da abundância

Temos hoje uma fome visceral de algo indefinível, a íntima certeza de que há algo em falta. Falta deus na equação, falta o divino, o privilégio do inexplicável, a alegria infantil da maravilha. Temos fome e sede de um recém nascido limpo e imaculado, que inaugure um mundo novo, cheio de promessas. Temos ânsias de um de crer sem reservas, de milagres com arbustos que não queimam e de finais felizes...

E é por isto que corremos como morcegos cegos, ávidos de sangue e calor, de vida em vertigem.
É por isto que somos borboletas nocturnas sôfregas por luz, que voam incertas e desastradas, gravitando trôpegas em torno de uma sombra ténue.

Somos adultos sérios e compenetrados, chorando pelas crianças que matámos no caminho.

Por isto celebramos com pompa e mentira cada fogo-fátuo, cada sinal de fumo ou rumor de nascente.
Por isto juramos ouvir zebras e tudo o que chega são mulas cinzentas e cansadas.
Por isto corremos maratonas, trémulos e incrédulos, pesando cada passo com uma confiança de fachada.
Por isto nos lançamos no lago, mesmo quando não vemos o fundo.

Por tudo isto, temos fome e sede, e vivemos num deserto, e ao virar da esquina está um oceano.

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