Hoje ouvi uma voz alertar para os tempos conturbados e negros que correm. Como é difícil estar vulnerável e ser frágil e doente nestes dias. A crise obedece ao culto do forte, do perfeito, do bem sucedido. Não há lugar aos outros, nega-se a sua existência para resumi-los à insignificância. Quando a crise é um crivo que escolhe cruelmente os mais aptos, ser-se solidário entra na clandestinidade. Sussurram-se necessidades e buscam-se discretas soluções. Há medo, não se grita, não se sorri, é melhor ser-se triste e submisso.
Mas negar aos outros o direito de ser, não lhes amputa a existência. Vão continuar a existir velhos e crianças, pobres e doentes. A identidade solidária de cada um será posta à prova como nunca, haverá o tempo de esconder esta identidade, mas nunca de a negar. A sua exortação relembra-nos porque somos humanos, porque o nosso mundo é humano. Porque ainda é permitido sonhar e acreditar, mesmo que em surdina, mesmo que a dormir. O direito de não morrer não poderá surgir como o único exercício que resta. Porque, não obstante estes reis e príncipes sem consciência, estupidamente espertos e socialmente acéfalos que temos, ainda somos, ainda subsistimos, ainda não morremos, nem em voz nem em braço.
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